A visão do uau
A visão do Uau !
A vida confronta-nos com tantas crueldades, que os “óculos de maravilha” acabam por ficar esquecidos
Já me descrevi muitas vezes ao longo da minha vida como “ingénua”, ou “inocente” (demais), por vezes até “distraída”. Os obstáculos ao longo do caminho são mais do que muitos, e conforme vamos crescendo, aqueles óculos de criança que nos permitem ter a “visão do uau” vão sendo usado cada vez menos vezes; ficando cada vez mais guardados na caixinha, até se tornarem uma lembrança muito muito distante...
Até eu, que sempre fui a tal “ingénua”, ou “distraída”, já fui confrontada com tanta crueldade, que me esqueci dos meus óculos de criança no fundo da mala. Por dias, semanas, meses. Simplesmente porque, em certas alturas, era demasiado “pesado” continuar a acreditar sempre no melhor das pessoas, só para ser desiludida logo a seguir.
Vamos p’rá frente que atrás vem gente
Na minha missão de fazer da minha arte um ganha pão, sempre tive uma noção muito real do imenso, gigante, trabalho que me esperava, mas isso nunca me assustou. Tenho um filho pequeno que precisa de mim, tenho um trabalho a tempo inteiro, que é super exigente e me absorve a maior parte da minha energia, enfim. Não faltam obstáculos.
Mas posso também dizer que uma das minhas maiores dicotomias é essa, ser uma pessoa ansiosa e que por isso naturalmente visualiza muitas possíveis tragédias (ou por popular expressão, “faz muitos filmes”). Mas em outras coisas avanço mesmo sem medo, e as coisas que eventualmente possam correr mal nem sequer me passam pela cabeça.
Eu visualizo o objetivo, aponto a mira, e lá vou eu. O que quer que possa ir acontecendo pelo caminho, pode e vai acontecer, mas quando lá chegar logo vejo. É assim que a minha cabeça funciona. E agora descrevo-me como, destemida? Descontraída? Corajosa?
Independentemente de como te escolhas identificar, há um denominador comum nestas opções todas: é o medo! E o medo é péssimo, porque faz-te congelar. É uma reação ancestral, guardada lá muito nos confins do cortex cerebral, ainda dos tempos em que sair da caverna podia significar ser morto por um predador qualquer. A verdade é que, já vivemos num tempo que poucos perigos destes apresenta (dependendo também claro, do país em que te encontras e da situação específica...), mas essa reação visceral do “finge-te morto senão o bicho apanha-te” ainda não foi adaptada aos tempos modernos.
Nos meus workshops, encontro muitas pessoas dominadas por vários medos: o medo do papel em branco; o medo de falhar; o medo de não corresponder à sua própria expectativa ou à dos outros; etc etc. Por isso tento sempre começar com um ponto de partida: faz, o que queiras, da maneira que queiras, sem quaisquer instruções.
Todas as pessoas são diferentes, algumas já vêm com muitas ideias feitas, já desenvolveram muito uma determinada técnica, e não se conseguem libertar daquilo (porque é o aquilo com que se sentem confortáveis); outras partem mesmo do zero, gostam muito de ilustração e desenho e decidem “arriscar” vir a um workshop para aprender mais.
Mas é muito importante todos perceberem de onde estão a começar, para no fim, e depois de dadas as ferramentas certas, possam ver a sua evolução apenas em meia dúzia de horas, porque o nosso cérebro é uma máquina fantástica que aprende à velocidade da luz!
E no final, todos dizem “uau! não me sabia capaz disto”. Essa é a maravilha de usar os óculos certos e arriscar fazer alguma coisa, em vez de ficar só parad@ a ver ilustrações bonitas no feed do instagram.
Por isso, e quando tiveres dúvidas se és capaz ou não, coloca os teus “óculos de maravilha” e tenta ver o lado positivo das coisas. Essa é uma arte que já aperfeiçoei ao longo dos anos, e que sempre me ajudou a enfrentar as situações mais difíceis: há sempre, SEMPRE, algo positivo em todas as situações da vida. E é a essas coisas que temos que nos agarrar para fazer o navio avançar.